Tal assunto fora disciplinado, por várias oportunidades, no âmbito do serviço público federal, através de instruções normativas, cujo histórico se faz relevante, juntamente com a análise da jurisprudência do Colendo TCU.
A reserva técnica nos contratos de prestação de serviços, em suma, decorre dos custos inerentes à substituição de mão-de-obra quando da ocorrência de atrasos ou faltas que não sejam amparadas por dispositivo legal e, ainda, abonos e outros, de forma a assegurar a perfeita execução contratual.
Tal assunto fora disciplinado, por várias oportunidades, no âmbito do serviço público federal, através de instruções normativas, cujo histórico se faz relevante, juntamente com a análise da jurisprudência do Colendo TCU, a fim de que seja feita uma melhor compreensão do tema, iniciando-se pela observância da IN 2/08, in verbis:
IN SLTI/MP 2/08
Art. 29-A – A análise da exequibilidade de preços nos serviços continuados com dedicação exclusiva da mão de obra do prestador deverá ser realizada com o auxílio da planilha de custos e formação de preços, a ser preenchida pelo licitante em relação à sua proposta final de preço.
(…)
§ 3º – É vedado ao órgão ou entidade contratante fazer ingerências na formação de preços privados, por meio da proibição de inserção de custos ou exigência de custos mínimos que não estejam diretamente relacionados à exequibilidade dos serviços e materiais ou decorram de encargos legais, tais como:
(…)
II – Impedir que a empresa venha a estabelecer em sua planilha custo relativo à reserva técnica; (destaques acrescidos)
Como se verifica, o Ministério do Planejamento disciplinou a matéria, com a expressa previsão de que a administração pública federal NÃO PODERIA IMPEDIR que as empresas apresentassem planilhas com custo relativo à reserva técnica, quando da participação em certames.
O entendimento da Colenda Corte de Contas Federal, em relação à matéria, tem oscilado ao longo desse período. Inicialmente, percebeu-se a contrariedade do TCU ao estabelecido na supracitada IN SLTI/MP 2/08, com o entendimento de que a previsão da reserva técnica estaria onerando indevidamente a administração, tendo em vista a ocorrência de renegociações de contratos com a exclusão desta parcela da planilha de custo, sem a ocorrência de prejuízos para a prestação dos serviços. Com base nesta conclusão, o citado Tribunal recomendou que se deixasse de consignar nas planilhas de preços as parcelas referentes à reserva técnica, bem como que o órgão ou entidade não aceitasse propostas de preços contendo custos relativos a esse item. (Acórdão 645/09-Plenário, relator Augusto Sherman Cavalcanti, 8/4/09; Acórdão 265/10-Plenário, relator Raimundo Carreiro, 24/02/10).
Ainda no ano de 2010, mais precisamente um mês após a prolação do acórdão 265/10-Plenário, o TCU flexibilizou o entendimento, de forma que continuou a determinar a não aceitação da presença do item “reserva técnica”, porém a admitiu caso houvesse a devida justificativa da necessidade de inclusão destes custos e dos percentuais previstos ou cotados. (Acórdão 793/10-Plenário, relator Benjamin Zymler, 9/3/10).
Em 6 de dezembro de 2013, o Ministério do Planejamento criou a IN 6/13, revogando os incisos do § 3º do artigo 29-A da IN SLTI/MP 2/08, de forma a não mais prever expressamente permissão de que as licitantes/contratadas inserissem o custeio da reserva técnica em sua planilha de custo.
Note-se que, até então, a situação existente era a seguinte: 1) a IN 2/18 assegurava amplamente o direito às empresas de incluir o custo com a reserva técnica na sua planilha de custos; 2) a jurisprudência do TCU dizia que somente era permitida a inclusão da reserva técnica nas planilhas de custos, caso houvesse a devida justificava.
Com o cenário trazido pela IN 6/13 do Ministério do Planejamento, a jurisprudência do TCU não se alterou, nem tampouco houve qualquer contrariedade ao novo cenário exposto, uma vez que a inovação da norma NÃO PROIBIA A INCLUSÃO DA RESERVA TÉCNICA, MAS APENAS NÃO MAIS ASSEGURAVA O SEU DIREITO EM QUALQUER HIPÓTESE.
Na verdade, o que houve foi a adequação normativa ao entendimento do Colendo TCU, deixando de tratar da garantia do direito amplo e em todas as hipóteses, para deixar que a jurisprudência da Corte de Contas Federal, que oscilou sobre o tema em algumas oportunidades, tratasse da matéria.
A mesma estratégia normativa foi mantida até então, inexistindo qualquer disposição específica na mais recente norma que trata do assunto, a IN 5/17-MPOG.
Em nova análise da matéria pelo TCU, já no corrente ano, por meio de decisão proferida no processo TC 010.048/11-8 (consulta interposta pela DPU, que buscava esclarecimento sobre ressarcimento de valores em decorrência da já citada IN 3/09), o ministro relator, Aroldo Cedraz, reiterou o mesmo entendimento firmado desde 2009 pela corte, no sentido de que É PERMITIDO O PAGAMENTO DA RESERVA TÉCNICA, DESDE QUE HAJA A JUSTIFICATIVA OU MOTIVAÇÃO para tal. Veja-se:
PROCESSO TC 010.408/11-8
VOTO DO MINISTRO RELATOR AROLDO CEDRAZ.
10. Por fim, relativamente ao tema da inclusão, nos orçamentos, do item reserva técnica, a remansosa jurisprudência desta Corte de Contas encontra-se assentada no sentido da admissibilidade do pagamento de tal reserva nos contratos findos ou pendentes, desde que devidamente motivado com estudo específico e também com a descrição dos eventos a que será destinada, consoante os Acórdãos 3.888/14 – 2.ª Câmara, e 1.202/14, 910/14, 288/14, 3.231/11, do Plenário.
Por óbvio que o custo com a reserva técnica não poderia ser extirpado indistintamente dos contratos públicos, especialmente quando se trate de serviços extremamente importantes, como vigilância em turnos ininterruptos.
Isso porque, entendimento em sentido contrário levaria a questionamentos como: de onde seria custeada a substituição do vigilante que venha a faltar por algum motivo? Pela empresa, mesmo sem haver previsão de despesa para isso? Certamente, essa seria uma conta que não iria fechar no decurso do contrato, uma vez que a empresa não poderia deixar de mandar um vigilante para uma escola ou para um hospital, no caso de falta, por exemplo.
O custo da substituição, portanto, acabaria resultando na inexecução do contrato ou ainda na subtração do pagamento de tributos ou direitos trabalhistas dos funcionários da empresa, a fim de que se consiga fechar a conta.
Percebendo o dilema, mas também buscando evitar que o custo com a reserva técnica seja incluído de forma desmedida ou desarrazoada, o Colendo TCU firmou o entendimento até hoje vigente, sustentando a legalidade da inclusão da despesa, mas exigindo a devida fundamentação para tal, acrescida de um estudo específico e também com a descrição dos eventos a que será destinada.
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Andrei Aguiar é sócio-diretor do escritório Aguiar Advogados.
Publicado em: https://migalhas.uol.com.br/depeso/287706/a-reserva-tecnica-nos-contratos-publicos-segundo-o-tcu